O que é isso de Protecção Civil?

 

José Pedro Caetano

 

Esta designação — Protecção Civil — tem quase tantos significados quantos aqueles a quem perguntamos opinião. Para uns, o conceito de Protecção Civil é tão apertado que apenas lá cabem os acidentes com mais de vinte e cinco vítimas mortais (catástrofes); enquanto que, para outros, o conceito é tão largo que engloba um buraco no alcatrão que provoca o simples rebentamento de um pneu.

Seja como for, ao longo da nossa História, têm sido tomadas diversas medidas visando a protecção das populações e que, de algum modo, podem ser consideradas como a génese da Protecção Civil. Nesse âmbito destaca-se, pois, a legislação promulgada, em 1395, por D. João I que, ordenando aos carpinteiros da cidade de Lisboa que acorressem aos incêndios e que com os seus machados os atalhassem, pretendia salvaguardar pessoas e bens. E isto é Protecção Civil. Mas o seu modelo manteve-se durante muitos e bons anos arredado de uma organização de nível e eficácia nacionais, tendo sido somente a partir de meados do século XIX, com a implementação do voluntariado, que se construiu uma malha de associações de bombeiros voluntários que, pela primeira vez na nossa História, garantiu a cobertura de todo o país. Mais tarde, já em plena 2ª Guerra Mundial e com receio do alastramento do conflito a Portugal, o governo de Salazar criou a DCT — Defesa Civil do Território, organismo integrado na Legião Portuguesa, cujos objectivos visavam, em particular, a protecção das populações contra os efeitos dos bombardeamentos. Para isso, a DCT distribuiu também algum equipamento e manuais pelos bombeiros, tendo-lhes igualmente garantido instrução. A DCT, no entanto, esteve particularmente activa no final da Guerra e início da chamada Guerra Fria quando procurou incutir noções básicas de segurança a uma população que, pela primeira vez, ouvia falar em bombas atómicas.

Com a queda do regime e sequente extinção dos seus organismos emblemáticos, criou-se um vazio na área da Protecção Civil, o que, uma vez mais, foi colmatado pela acção dos corpos de bombeiros. Mas, em 22 de Fevereiro de 1975, através do Decreto-Lei nº 78/75, foi criado, na dependência do Ministério de Defesa Nacional, o Serviço Nacional de Protecção Civil.

Ainda recentemente, a Protecção Civil sofreu mudanças com a introdução do Serviço Nacional de Bombeiros. Até porque a multiplicidade de organismos com intervenção directa nesta área de capital importância para o bem-estar e segurança das populações tem dificultado sobremaneira a estabilização do sector.

Constatou-se que, recentemente, o Governo entendeu reunir num único organismo os

Bombeiros e a Protecção Civil. Ficou-se, pois, na expectativa que desta união resulte algo mais do que a soma de duas estruturas que, muitas vezes, têm estado de costas voltadas, funcionando como lobbies organizados, preocupando-se apenas com a defesa dos seus interesses, o que claramente se reflecte na guerra travada em torno do nome do novo organismo.

Mas, ao deixar de fora o INEM, o Governo cometeu — quanto a nós — um erro crasso, porque não existe Protecção Civil sem a componente da saúde. Razão esta que já foi apreendida na vizinha Espanha, onde funciona (e bem) um modelo integrado de múltiplas componentes, entre as quais a emergência médica. Até porque os exemplos que nos vão chegando de todo o mundo reforçam a necessidade de uma prestação de socorro médico imediato e especializado, como se tem verificado em catástrofes recentes, nas quais, e no âmbito da prestação de auxílio internacional, Portugal tem vindo a intervir, ainda que essa participação por questões financeiras seja, por vezes, cortada. Mas dever-se-ia, porque estas actuações são uma fonte valiosa de ensinamentos reais, apostar nessas colaborações e aproveitar os seus ensinamentos, porquanto constituem ferramentas valiosas para melhorar o sistema, o qual tem de ser entendido como um processo dinâmico e de aprendizagem constante, de forma a lidarmos melhor com as nossas próprias fragilidades.

Refira-se, por outro lado — e na continuidade do que vem sucedendo pelo menos desde o século XIX — que não existe Protecção Civil sem os Bombeiros, homens e mulheres que estão sempre na primeira linha, defendendo as populações, os seus bens e as florestas. São, na realidade, os primeiros a intervir nos acidentes, independentemente da sua natureza, e, por isso, possuem já (de uma forma geral) meios e equipamentos e todo um background de conhecimentos que se apresentam como absolutamente fundamentais para a segurança dos cidadãos.

Também as forças se segurança constituem peças importantes na implementação do conceito de Protecção Civil; assim, a Guarda Nacional Republicana (cinco estrelas aos novos agentes destinados ao fogo florestal), a Polícia de Segurança Pública e as policias municipais, ao garantir a segurança, quer das populações afectadas, quer elementos de socorro, são indispensáveis em caso de sinistro.

E, no âmbito do conceito lato de Agentes de Protecção Civil, importa referir a Cruz Vermelha Portuguesa, prestigiosa instituição que tem permanecido arredada da discussão, mas à qual importa definir que papel irá

 

 

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