BOLETIM
Associação de Defesa do Património de Sintra Distribuição Gratuita Julho de 1999 – N.º 1 – 2ª Série APARTADO 1017 – Sintra Vila 2711-801 SINTRA |
Após alguns anos de interregno, reiniciamos a publicação do "PATRIMÓNIO", em consequência de continuarmos convencidos que a informação de que possamos dispor, sobre a conservação dos Patrimónios Natural e Edificado de Sintra, é um meio indispensável para despertar as pessoas para os muitos problemas que essa mesma conservação enfrenta. Só do esclarecimento possível, das questões que se levantam, pode resultar uma convergência de esforços que alcance a persecução da preservação daqueles Patrimónios. Se, por um lado, a celeridade dos avanços científicos, tecnológicos, a mundialização dos mercados e a mobilidade das pessoas e da comunicação, deram contributos relevantes, beneficiando as condições de vida e de saúde de um grande número de pessoas, por outro lado, fizeram disparar a exploração dos recursos naturais, um consumismo redundando em desperdícios, a poluição, novas causas de doença a criminalidade, o consumo incontido de droga, a desestabilização social, etc. Problemas estes que estão a abalar as estruturas governativas desviando as adequadas capacidades de respostas a vários problemas, nomeadamente no que respeita à degradação ambiental. Por estas razões, é essencial que os cidadãos se interessem pela defesa da conservação dos Patrimónios Natural e Edificado, como legados que são de toda a comunidade e por cuja preservação também todos somos responsáveis. A sociedade civil deve contribuir para essa defesa, quer participando nas respectivas associações e reclamando as medidas necessárias, quer promovendo o culto do espaço público, velando e levando os seus próximos a velar pela limpeza da sua rua, pela preservação do jardim do seu bairro, pela distribuição dos detritos caseiros pelos respectivos recipientes, etc. A mobilização e a colaboração organizada dos cidadãos na solução de alguns problemas sociais e ambientais é apanágio das sociedades, na actual fase da Civilização Ocidental.
L.O.S.
INCÊNDIOS, UM PERIGO PARA A FLORESTA
Todos os Verões ficamos chocados com as imagens desoladoras dos incêndios a devorarem milhares de hectares de florestas do país. É uma época de sobressalto para todos os que admiram a Serra de Sintra e a consideram um património florestal ímpar, tanto pela variedade da sua vegetação, como pela beleza das suas paisagens. O estado actual de abandono da Serra transforma-a num autêntico rastilho, devendo-se, o facto não ter havido uma calamidade, àqueles que de dia e de noite efectuam a prevenção dos fogos. Já este ano, na noite de 16 de Junho, deflagrou um incêndio nas encostas do Rio da Mula. De imediato, foram detectadas, em locais distintos, mais quatro frentes de incêndio. Três delas entre Pocinhos e Pedra Amarela e uma outra em Janes. Segundo os bombeiros, tendo em consideração a hora e a sua simultaneidade, a origem dos referidos incêndios, que consumiram cerca de 40 hectares da preciosa floresta, parece ter sido criminosa. Preocupa-nos sobretudo o facto de não serem efectuados, há demasiados anos, os indispensáveis trabalhos de conservação e limpeza na maior parte das suas matas e dos seus parques. Por toda a Serra se encontram árvores e troncos derrubados, o mato tomando conta dos bosques, dos caminhos e dos aceiros, as acácias destruindo a flora autóctone, e toda a sua magnificência verdejante ir sendo obscurecida por um imenso matagal. Insistentemente esta Associação tem apelado a diversas entidades estatais para que sejam tomadas as medidas necessárias para reverter a referida situação de degradação florestal. É deplorável verificar o passar dos anos sem que sejam decididas providências urgentes para obstar à deterioração de um Património classificado de Mundial pela UNESCO, que também é uma Área de Paisagem Protegida, e que há séculos é considerado um dos sítios mais admiráveis da Terra. Para conservar e preservar esta Serra é indispensável que se incrementem um conjunto de acções e projectos adequados e coerentes, compreendendo diferentes modalidades e situados em diversos espaços, por forma a promoverem a sua conveniente manutenção e a presença humana em vários locais da Serra. Considera-se que, entre outros, os seguintes procedimentos se enquadrariam nos referidos objectivos:
1) - A existência de pessoal permanente, à semelhança do que acontecia antigamente, quando havia jardineiros que trabalhavam nos parques, pessoal dos Serviços Florestais que limpavam as matas, cantoneiros que cuidavam das estradas, guardas florestais que vigiavam a Serra e nela residiam e de elementos da Guarda Nacional Republicana que impunham a sua presença a pé ou a cavalo. 2) - A presença humana, em áreas agora desertas não só através da concessão de habitações aos respectivos trabalhadores, mas também, com a reabilitação de espaços públicos e privados, obedecendo a critérios rigorosos, por forma a garantir a sua continuada conservação. 3) - A recuperação de edifícios abandonados, existentes nos Parques ou Matas Nacionais, como o Chalet da Condessa, as antigas habitações dos guardas, as abegoarias, as cavalariças, etc. e o seu aproveitamento para a instalação de uma escola de jardinagem ou de equitação, ou como espaços destinados a encontros temáticos sobre literatura, história, ecologia, etc. ou exposições, a recitais de música, a pequenas unidades museológicas, a salas de chá, etc. 4) - A abertura de novos itinerários e trilhos com interesse paisagístico. A colocação de algumas placas onde constasse a denominação botânica de algumas espécies da flora, e outras descrevendo sumariamente o local e a paisagem circundante. 5) - A organização de passeios guiados destinados a turistas nacionais e estrangeiros, correspondendo a uma época em que o benefício para a saúde proveniente do facto de andar a pé, é um dado adquirido. 6) - A recuperação da tradição de utilizar as "burricadas" como meio de locomoção típica ao longo da Serra.
Visar-se-ia assim, através de vários factores, criar condições para privilegiar um turismo de qualidade e, também, uma continuada afluência de visitantes e de participantes aos vários locais onde decorreriam os eventos. A conjugação das diversas actividades permitiria ultrapassar o perigoso estado de abandono e de devastação em que se encontra o Património Natural e Edificado da Serra de Sintra.
A preservação das florestas e a sua não destruição pelos incêndios depende, também, do cuidado e do civismo de todos e de cada um de nós.
Já este texto estava escrito, quando fomos abalados pela notícia do incêndio que devorou todo o interior e o telhado do Chalet da Condessa, situado no Parque da Pena. Deveu-se às ocasionais condições climatéricas o facto de, felizmente, o fogo não se ter propagado ao Parque. Aquele invulgar Chalet, mandado construir pelo Rei D. Fernando, marido da Rainha D. Maria II, tinha interessantes pinturas e estuques decorativos da época da sua construção. Embora as entidades competentes tivessem sido insistentemente alertadas para o seu estado de degradação, o edifício estava há décadas a aguardar obras de conservação e restauro. A cobertura, que sobre ele colocaram há 6 anos, criou expectativas de obras que jamais se realizaram. Urge, agora, erguê-lo das cinzas, assim como urge evitar a derrocada total do Convento dos Capuchos, e resgatá-los, para que as memórias históricas que eles guardam possam permanecer.
O estado de deterioração do Património Natural e Edificado da Serra de Sintra é consequência de uma reiterada e incompreensível falta de interesse, das entidades competentes, pela sua preservação. Esta incúria, a que o mesmo Património tem sido votado, exige uma tomada de decisão que envolva medidas especiais de emergência que detenham o avanço diário da sua devastação.
L.O.S.
Verificamos com agrado o facto da Câmara Municipal de Sintra, corresponder à sugestão desta Associação, ter mandado mudar a posição de alguns placards, a qual se tornava perigosa em relação a invisuais e crianças ou para a visibilidade do trânsito.
A afluência e fama das praias da costa de Sintra, justificaria a colocação de chuveiros no areal e a existência de sanitários públicos. São equipamentos que acrescentam uma nota de maior civilização às praias.
Membros desta Associação acompanharam e foram entrevistados por elementos da comunicação social, entre outras ocasiões, quando aqueles elementos realizaram reportagens sobre o incêndio do Chalet da Condessa e sobre o estado da enorme degradação do Convento dos Capuchos. Neste último caso, também participaram numa acção de chamada de atenção para a referida situação.
O AMBIENTE EM PORTUGAL
1 - NOTAS SOBRE A SUA SITUAÇÃO
Embora, em Portugal, as fontes geradoras de poluição não atinjam um volume comparável ao dos países altamente industrializados, se as nossas empresas não renovarem a sua tecnologia, afim de ao mesmo tempo pouparem energia e diminuírem o impacto poluidor, e se o Estado não fiscalizar o cumprimento dos requisitos necessários a esse efeito, então caminharemos para uma espiral de deterioração do ambiente, em vez de conseguirmos um desenvolvimento sustentável, no qual a componente ambiental seja um elemento intrínseco.
Dados de 1994 estimavam que 75% dos resíduos industriais eram eliminados no solo ou no subsolo. Os problemas relativos à incineração dos resíduos industriais e hospitalares ainda não foram solucionados. Por outro lado, só agora está em curso um programa de erradicação das lixeiras e a criação de uma rede de aterros sanitários. Registe-se, nos últimos anos, a profusão da recolha selectiva dos resíduos sólidos urbanos, a qual serve cerca 90% da população. Porém, a situação do seu tratamento e eliminação é desigual nas várias regiões. Embora se verifique um empenho significativo, apenas 55% da população é servida por um sistema de tratamento de águas residuais e uma percentagem considerável não usufrui do simples sistema de drenagem. As explorações pecuárias não dispõem, na sua maioria, dum sistema de tratamento dos seus efluentes. Entraram recentemente em funcionamento, em várias localidades do Concelho de Sintra, estações com o conveniente tratamento de águas residuais, e noutras decorre a execução dos correspondentes trabalhos. Espera-se que se verifique, rapidamente, a sua extensão a todos os agregados urbanos. Algumas zonas com maior concentração industrial, em várias freguesias do Concelho, tornam-se mais vulneráveis aos efeitos da poluição, caso não sejam tomadas as devidas medidas preventivas.
Os níveis de emissão de alguns gases elevam-se acima dos liminares das Normas da Qualidade do Ar nas regiões do Grande Porto, de Estarreja, da Grande Lisboa e Vale do Tejo, ou seja em áreas de grande concentração industrial ou/e urbana.
Os efeitos poluidores também atingem os recursos hídricos. Tanto os rios como as águas interiores são atingidos pela poluição, naturalmente com especial incidência para a zona costeira onde existe maior concentração industrial e urbana, nomeadamente a Região do Grande Porto e da Grande Lisboa, e a Ria de Aveiro, e ainda em zonas dispersas do interior em consequência da suinicultura, dos lagares de azeite e da agricultura intensiva. Algumas ribeiras do Concelho de Sintra também sofrem efeitos poluidores, exalando um cheiro fétido. É do conhecimento geral que a água que é abastecida ao público não corresponde, em largas zonas do país à qualidade mínima exigida. Apesar de todos os planos de ordenamento, outro factor de grave agressão ambiental deriva da construção de prédios, frequentemente desenfreada e anárquica, em terrenos que deveriam ser preservados. Constroi-se, por vezes, obstruindo linhas de água e ocupando e impermeabilizando vastas áreas com betão, do que resulta a não absorção das águas pluviais, com todas as consequências daí decorrentes. A continuação da construção desregrada, sem respeito também pelas características paisagísticas ou arquitectónicas locais, nem oferecendo as necessárias infra-estruturas em espaços verdes, em acessibilidades e em equipamentos sociais, que originam densas áreas habitacionais desumanizadas, com repercussões nas esferas sociais, cívicas e culturais dos seus habitantes, geradores de conflitualidade social e de marginalidade. Situações estas que, também infelizmente, se verificam no Concelho de Sintra, e são decorrentes da pressão urbanística, com maior incidência ao longo do caminho de ferro Lisboa-Sintra.
Também é preocupante o estado de abandono em que se encontram as florestas deste país, tendo como consequência não só a sua delapidação pelo mato e pelas espécies infestantes, assim como o facto de se multiplicar o risco de serem consumidas pelos incêndios, tanto mais que os arruamentos e aceiros se encontram, em grande parte, obstruídos. Esta situação de deterioração das florestas, além de constituir um prejuízo para a riqueza natural e paisagística, também se traduz em enormes perdas económicas para o país, tanto pelo que respeita ao valor propriamente florestal, como no que se refere à erosão dos solos. Exemplo flagrante desta situação é o estado em que se encontra a Serra de Sintra, onde as árvores e os troncos derrubados, o mato e as acácias infestantes tomaram conta dos bosques e das veredas, transformando um dos mais admirados prodígios da natureza num autêntico matagal.
A defesa do ambiente não se pode alcançar com o alheamento da sociedade civil e da sua ancestral falta de apetência de associação, e de participação, de reivindicação e de responsabilização cívica, e com o pouco culto que dedica ao espaço público, decorrentes dum desfasamento cultural e informativo em relação aos problemas da época que vivemos (ainda persistem 13% de analfabetos e somos o país da Europa como menor índice de leitura de jornais). Subsiste, também, um afastamento, em vez de articulação, entre o Estado e a sociedade civil, incluindo a classe empresarial, dificultando o combate aos complexos problemas trazidos pela actual sociedade de consumo e pelo mercado globalizante, que se, por um lado, proporcionam a abundância e o bem estar, nos países desenvolvidos, por outro, ocasionam o depauperamento dos recursos naturais e o aumento da poluição derivada tanto das diversas actividades industriais, como dos embaraçosos desperdícios urbanos e industriais.
Não obstante os condicionalismos ambientais existentes, se Portugal em pouco mais de três décadas, (com início em meados da década de 1960, quando se integrava na Associação Europeia de Comércio Livre - EFTA) conseguiu melhorias económicas e sociais rápidas, comparativamente com evoluções verificadas anteriormente nos países desenvolvidos, é também plausível que consiga ganhar a batalha da preservação ambiental, desde que se conjuguem os seguintes factores: avanço qualitativo na educação, a expansão de uma informação esclarecedora e um maior envolvimento dos cidadãos e das suas associações na defesa dos interesses colectivos, nomeadamente nos domínios relacionados com os problemas ambientais.
L.O.S.
Bibliografia: - Plano Nacional da Política do Ambiente - Ministério do Ambiente. - A Formação de Portugal Moderno: A evolução social 1960-1995 - coordenado pelo Dr. António Barreto. |