Em defesa dos solos aráveis
O arquitecto urbanista
Étienne de Groër, na “Memória Explicativa”, no seu Plano de Urbanização
de Sintra, já em 1949 descrevia e defendia (usando as designações
próprias da época) com grande lucidez e sensibilidade, a zona rural que
se estenderia na envolvente de Sintra e a sua Serra até ao mar, conforme
abaixo transcrevemos alguns excertos.
A Serra de Sintra e toda
a região circunvizinha ... representam, pela beleza do sítio, uma grande
riqueza nacional que é essencial proteger contra a invasão dos
loteadores, dos construtores de prédios de rendimento e dos industriais.
Toda esta região deve ficar tão densamente arborizada como está
actualmente, e os espaços rurais que fazem parte dela devem conservar o
seu aspecto campestre.
Neste Plano de Urbanizaçãoi,
o uso dos solos está bem explícito e duma forma muito sensata e
competente, Groër aplica medidas para a conservação da identidade de
toda a região Sintrense assim como indicações precisas acerca da
salubridade e consequentemente da melhoria da qualidade de vida dos seus
habitantes
O legado de Groër, indicando a
importância dos vinhedos, pomares e hortas, tem caído no esquecimento,
tal como a política de ambiente e ordenamento do territórioii
lançada pelos seus defensores os arquitectos Gonçalo Ribeiro Telles e
António Viana Barreto.
É com preocupação que temos
assistido à pouca importância que a conservação dos solos aráveis e
terras férteis, têm merecido ao longo dos últimos anos, assim como têm
sido pouco relevantes a protecção, limpeza e aproveitamento de minas e
poços como se a água potável fosse um bem inesgotável.
Não podemos concordar que se
possa construir em solos com aptidão agrícolaiii,
destruindo a capacidade das gerações vindouras na produção de alimentos.
É utópico pensar que em caso
de catástrofes ambientais, ou outras, dos países de onde importamos bens
alimentares, esses povos ficariam à míngua para nos obsequiarem com o
que lhes faria falta para a sua sobrevivência.
Assim entendemos ser urgente
a organização de um gabinete vocacionado para a preservação dos centros
históricos do concelho e sua envolvente agrícola se for esse o caso,
englobando também um conselho consultivo dedicado ao ambiente.
É necessário que o Parque
Natural Sintra-Cascais disponha de uma Direcção exclusivamente a si
dedicada, um conselho consultivo renovado e um corpo técnico disponível
para de uma forma itinerante preste aconselhamento aos agricultores e
agilize projectos compatíveis com a revitalização agrícola, permitindo
que os jovens se fixem nas terras que herdaram dos seus avós.
Consideramos que todas as
organizações existentes no Concelho de Sintra que tenham uma ligação ao
mundo rural, se devem reunir regularmente para encontrar soluções para
os diversos problemas e fazer pedagogiaiv
junto de quem está menos sensibilizado para os valores em questão e
possa resistir aos apelos de “fazer cabidela com a galinha dos ovos de
ouro”.
Há que ter presente que se a
par do património construído, não for igualmente acautelado, o
património natural, serão postos em causa os valores específicos de
Sintra que levaram à sua classificação como Paisagem Cultural da
Humanidade
Associação de Defesa do
Património de Sintra
escrito de acordo com a antiga
ortografia
i
Plano ainda em vigor e em revisão.
ii
Primeiros diplomas de política do ambiente:
Decretos-Leis nºs. 343/75 de 03 de Julho (Protecção da Paisagem,
visando impedir as actuações que comprometem a cultura e os valores
turísticos das regiões); 356/75 de 08 de Julho (Protecção dos Solos
Agrícolas, pois são um recurso facilmente degradável e sendo muito
escassa no nosso país, a percentagem do solo com boa capacidade
agrícola); 357/75 de 08 de Julho (Protecção da Vegetação, prevenir o
derrube da vegetação e os grandes movimentos de terras que
inutilizam solo arável, apontando o papel das autarquias);
iii
Apesar da legislação de protecção dos solos
(REN e RAN), têm sido propostos ao longo dos anos a sua
desclassificação para possibilitar a utilização dos terrenos para
construção. Encorajar a reabilitação do edificado das nossas aldeias
e vilas irá contribuir para que não seja inutilizado mais solo com
novas construções
iv
Existe material didáctico (folhetos e pequenos
filmes) que estão esquecidos e não são mostrados. Há que
recuperá-los criteriosamente.
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